O calvário de um atleticano


Mais um dia na vida de um atleticano. Só que com um difencial, o time jogaria na Argentina, numa Libertadores, 13 anos depois da sua última disputa deste torneio.
Tudo estaria bem se ele não fosse universitário e tivesse uma apresentação de trabalho no horário do jogo.
Não pensava na professora, uma ruiva fogosa e ardente por sangue de jovens acadêmicos. Pensava em como Ronaldinho faria para furar a defesa, e Tatatatardelli fazer um extermínio com sua metralhadora giratória. 
- Como eu faço para assistir meu deus do céu - falava o ateu torcedor com as mãos na cabeça.
As horas passavam, e o nervosismo cresce. E a unha diminui, o garrafão de água se acaba, os tics ficam cada vez mais evidentes.
Começou a torcer.

12h. Já tinha preparado o que tinha que falar.
- "A mudança do sistema arcaico dos senhores de engenho para o progresso trazido pelo capitalismo foi pelo fim do tráfico negreiro em 1831..." e puta que pariu! Errei de novo essa bosta de data!    
Agora era tomar banho e ir para o serviço. Enquanto procura a toalha, que brinca de esconde-esconde na hora que o incauto mais precisa de tomar banho, o tênis também adota essa tática. Só que isso ele vai descobrir depois.
O telefone toca. Ele foi atender, e não era seu amor.
"Quero fazer algo diferente contigo" está escrito na tela. Ele senta na cama e pensa.
- Essa danada tinha que querer isso hoje, logo hoje!

13h56. Chega esbaforido ao prédio da década de 50. O tênis havia sumido, os papéis a ser entregues estavam em outra pasta, além de estar com a perna ralada por ter escorregado no banheiro. Nada demais. Já tinha alcançado seu "nirvana momentâneo".
- Boa tarde...
- Boa tarde Judite, desculpe o atraso.
- Ah, sem problemas. Uma coisa, quero que você protocole estes documentos aqui e coloque na mesa do gerente.
- Sim.
Era uma senhora pilha de documentos.
"E agora, tenho que ler para a apresentação", pensa.

16h15. Agora sim, lê sobre a apresentação.
Mas a comunidade do Atlético no Orkut está mais interessante. O Twitter deve estar bombando de argentino digitando sobre los hinchas del Mineiro. 
- Ela que espere um pouco - disse olhando para os papéis da apresentação.
- O quê? - dizia sua chefe, não entendendo porque falou isso.
- Pensei alto.
E lá vai digitar a senha no Twitter.

18h00. Em casa, finalmente.
- Puta merda, tenho que tomar banho e ir pra aula!!!
Corre até o chuveiro e descarrega aquele monte de água morna na sua cabeça.
"Primeiro apresento, falo um 10 minutos, encerro, saio vazado, pego aquele busão e chego a tempo. Mas, porcaria, será que aquele Carbonero é perigoso mesmo? Assisti aquele jogo contra o Vélez e o cara destruiu, puta merda. Tomara que o Victor cate todas hoje."
Sai de casa e esquece o isqueiro, como é que ele vai relaxar fumando no caminho da universidade?

18h45. Tá na pilha.
- Oi Fred...
- Oi coração, tudo bom? Esqueci a porra do isqueiro em casa.
- Ah, toma aí. Preparado pra hoje.
- Vamo ver, né. Tô confiante.
- Pois é. A professora mandou um email hoje à tarde mudando os temas dos grupos para a apresentação hoje.
Já pega trêmulo o isqueiro. Mal consegue acendê-lo.

19h15 A devassa chegou.
- Então gente, vamos começar a apresentação? Hoje eu vi que vieram um pouco de alunos, mas vamos continuar. Agora é o grupo do Marlon, ele vai falar sobre as características dos espanhóis e portugueses na cultura brasileira.
- Bem, a cultura espanhola, como a cultura ibérica em geral...
"Puta que pariu, puta que pariu! Agora tenho que achar a porra do arquivo com as outras matérias pra poder falar... Hahaha, achei! Tomara que o grupo dele apresente rápido!"
O primeiro ônibus sai da universidade 20h40. Cronometra, olha para o lado, e vê a apresentação.

19h45. Ele ainda não acabou.
O pobre torcedor já tá sofrendo do lado de fora da sala. Bebeu uma aguinha e saiu olhando pro céu, escuro, chuvoso.
- Puta merda, hein Clara! Tive que sair. Aquele fedaputa não pára de falar há mais de meia-hora!
- E a Silvia ainda dá corda...
- Isso só porque o Galo joga, puta que pariu.
A torcedora colorada nem liga para isso, também está apertada com seus afazeres.
Fred caminha até a sala. O cara não havia terminado.

20h07. "Acabooooou! É tetra! É tetraaaaa!"
- Então vamos para o próximo grupo? Bruna, é a sua vez.
"Nãaaaao..." e bate a cabeça no teclado.

20h29.
- Fred, é sua vez.
"Até que enfim, sua devassa!"
- Como eram as cidades portuguesas e espanholas, escrita por Sérgio Buarque.
- E-então, a cidade espanhola era, era... Muito bem escolhido o local onde ia ser construído. As cidades... (ele acha o fio da meada) Eram uma forma de dominação, isso descrito pelo Sérgio Buarque. Eram escolhidos lugares mais frescos, onde o clima parecesse com o da Europa.
- Sim, continue.
"Oito e trinta e duas, caraia!"
- Portugal não tinha nem preocupação com o povoamento na colônia, estavam nem aí (começou aí a acabar logo). Portugal só tomou interesse quando descobriu pedras preciosas, como diz aqui no livro: “A circunstância do descobrimentodasminassobretudodasminasdediamantes foipoisoquedeterminoufinalmentePortugalapôrumpoucomaisdeordememsuacolônia, ordem mantida comartifíciopelatiraniadosqueseinteressavamemtermobilizadastodasasforçaseconômicasdopaíspara lhedesfrutarem, sem maior trabalho, os benefícios”.
- Calma, calma Fred, mais pausadamente. Então, podemos dizer que...
Enquanto ela fala, ele fecha o notebook, entrega algumas folhas aos seus colegas e concorda com tudo o que ela fala, ainda olhando para a hora. Pensou em ouvir um pouco a Itatiaia para saber como é que estava o time, mas achou que daria muita pinta ele não prestar atenção na parte da professora falar. Ficou concordando com a cabeça até ela acabar.
- Então gente, vamos emendar aqui, até porque não veio muita gente tal...
"Emendar, emendar o capeta, vou embora dessa merda agora!"
E pega seu material.

20h41. O ônibus liga o motor, ele aperta o passo. A chuva cai incessamente. Mas ele aprendeu que tinha que torcer não só contra o vento, mas contra a adversidade. Quando o ônibus ia zarpar, ele entra na frente.
- Páaara!
O motorista abre a porta e deixa entrar. Fred paga a passagem. Senta numa cadeira. Enfim, dever cumprido.
Agora é só esperar pelo Galo. Esperar mais uma alegria, soltar então esta voz contida durante o dia. Mandar realmente tudo ir para o inferno e então se sentir feliz de verdade, pois seu clube do coração vai jogar.


*****

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